O avanço da inteligência artificial (IA) está transformando setores diversos da economia, e a moda não é uma exceção. Com a capacidade dessas ferramentas em gerar criações autônomas e inovações disruptivas, surgem questões complexas para a legislação de Propriedade Intelectual (PI), que foi historicamente desenhada para proteger criações humanas. Este cenário desafia a legislação atual e exige uma reinterpretação das normas, especialmente no Brasil.
Desafios da autoria
Um dos principais desafios é a definição de autoria. Atualmente, a Lei de Direitos Autorais no Brasil (Lei nº 9.610/1998) estabelece que apenas pessoas físicas podem ser reconhecidas como autoras. Isso cria uma lacuna significativa no contexto de criações desenvolvidas por IA. Quando essa tecnologia cria um design inovador ou uma estampa, a questão de quem é o autor – a máquina, o programador, ou o usuário da automação – torna-se complexa.
Os desafios específicos incluem a responsabilidade legal. Se uma Inteligência Artificial gera uma estampa que infringe direitos autorais, quem deve ser responsabilizado? O programador, o usuário ou a entidade que desenvolveu a tecnologia? Além disso, a legislação atual não cobre direitos morais para criações de IA, como o direito ao reconhecimento e à integridade da obra. A falta de uma estrutura adequada pode levar a disputas sobre quem deve receber os créditos e como proteger a criação.
Registro de patentes e inovações autônomas
O registro de patentes para invenções geradas por tecnologia também apresenta desafios. As patentes são tradicionalmente concedidas a invenções resultantes de atividade inventiva humana. No entanto, com as inteligências realizando desenvolvimentos autônomos, o processo de atribuição de propriedade intelectual pode se complicar.
Aspectos relevantes incluem o critério de atividade inventiva. As patentes exigem que a invenção seja resultado de atividade inventiva, mas a avaliação desse critério torna-se difícil quando a criação é fruto de um sistema que utiliza algoritmos e dados complexos para desenvolver novas soluções. Além disso, essa ferramenta pode identificar tendências e gerar designs baseados em grandes volumes de dados. A legislação precisa abordar quem deve ser considerado o inventor e como os direitos de patente são atribuídos a invenções geradas por IA.
Proteção de Dados e Privacidade
A utilização de dados para treinar esses mecanismos também levanta questões importantes sobre privacidade e confidencialidade, especialmente no setor da moda, que usa big data para criar coleções alinhadas com as preferências dos consumidores.
Considerações cruciais incluem a conformidade com leis de proteção de dados, pois o uso de dados pessoais para treinar sistemas de IA deve estar em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). As marcas de moda devem garantir que o processamento de dados respeite as normas legais e proteja a privacidade dos consumidores. Além disso, o uso de imagens e dados de consumidores deve respeitar os direitos de imagem e privacidade. É essencial que as marcas garantam transparência sobre como os dados são utilizados e obtenham as permissões necessárias para evitar problemas legais.
Licenciamento de algoritmos e ferramentas de IA
O licenciamento de ferramentas e algoritmos de IA apresenta novos desafios para a Propriedade Intelectual. As marcas de moda que utilizam Inteligência Artificial para automatizar processos criativos precisam garantir que o licenciamento dessas ferramentas seja adequado e abrangente.
Aspectos a serem abordados incluem o escopo do licenciamento. A legislação atual não cobre totalmente o licenciamento de algoritmos de IA, o que pode gerar incertezas jurídicas. As marcas devem entender o alcance do licenciamento e as implicações legais associadas ao uso dessas ferramentas. Além disso, garantir a proteção dos direitos sobre algoritmos e modelos é crucial para prevenir usos não autorizados e assegurar que os criadores possam beneficiar-se dos seus desenvolvimentos.
O cenário atual demonstra que a aplicação das leis de PI no contexto da IA requer ajustes e regulamentações específicas que considerem os avanços tecnológicos. Para o setor da moda, isso significa repensar a forma como a criação, inovação e proteção são abordadas na era dos sistemas inteligentes. Advogados especializados em Fashion Law têm um papel fundamental em liderar essas discussões e se adaptar aos novos paradigmas que a IA impõe.
A integração das automações nas práticas de moda representa uma oportunidade para inovação, mas também exige uma atualização das leis e regulamentações para garantir uma proteção adequada dos direitos de PI. A colaboração entre advogados, desenvolvedores de IA e profissionais da moda é essencial para construir um framework jurídico que permita à indústria prosperar de maneira segura e sustentável no novo cenário tecnológico.
O Timmermans Advogados conta com uma área especializada em Propriedade Intelectual, sob a liderança da nossa sócia Frederica Richter, mestre em Propriedade Intelectual, atuando de forma estratégica, assessorando empresas no desenvolvimento e proteção de criações tecnológicas e designs inovadores.